Francisco de Assis

Quem foi São Francisco de Assis

São Francisco nasceu em Assis, na Itália, no ano de 1182. Sua mãe tinha origem francesa e era uma doce mulher. Batizou-o inicialmente como João (Giovanni), em homenagem a João Batista, mas logo que seu pai, Pedro Bernardone, rico comerciante de tecidos, volta de uma de suas frequentes viagens à França, muda seu nome para Francesco, em homenagem àquele país.

Francisco era um jovem muito alegre, que gostava de música, voltado para as românticas tradições que os trovadores propagavam. Em razão da prosperidade de sua família, dispunha de dinheiro em abundância e o gastava com ostentação, vestindo-se com as melhores roupas e promovendo festas regadas a vinho e comida para os amigos, dentre os quais se destacava por ser entusiasta e detentor de grandes ideais. Como todo jovem burguês daquela época, buscava uma causa, um motivo forte para que pudesse defender. E, assim, partiu em busca de fama, glória e títulos de nobreza, lutando nas guerras da época.

A Itália, como toda a Europa daquela época, vivia uma fase de grandes conflitos, marcada pela passagem do sistema feudal para o sistema burguês e o surgimento de pequenas cidades. Em razão das desigualdades sociais existentes, ocorreu uma revolta do povo contra os nobres da cidade de Assis.

Munido da ambição de tornar-se herói e incentivado pelo pai, Francisco desejava conquistar, além de fortuna, fama e nobreza. No ano de 1201, partiu para mais uma guerra que os senhores feudais, concentrados na vizinha cidade de Perúsia, haviam declarado contra a Comuna de Assis. Francisco, assim como muitos jovens, tomou partido na causa social do povo.

Em defesa dos nobres, a cidade de Perúgia enviou um exército bem preparado, que travou luta sanguenta na qual Francisco e seus companheiros foram presos. Francisco de Assis permaneceu encarcerado durante um ano, em ambiente isolado, frio e insalubre. Não fosse sua alegria contagiante, teria sucumbido à tristeza e à solidão.

De volta a Assis, enfraquecido e sem projeto de vida, adoeceu. Uma grave enfermidade o levou a ficar acamado durante longos meses até se recuperar. Durante esse tempo, fez profundas reflexões e, ao se restabelecer, Francisco se empenhou em outro ideal. Foi o caminho que Deus escolheu para entrar mais profundamente em sua vida. Sentia-se diferente. Começou a perceber a leviandade dos prazeres puramente terrenos, embora ainda não buscasse a Deus.

O jovem Francisco conservava ainda a ambição da fama. Por esse motivo, sonhava com a glória das armas e a nobreza, que se conquistavam nos campos de batalha. Como a igreja buscava voluntários para as suas lutas em defesa dos territórios, Francisco preparou-se com a melhor armadura de cavaleiro. Nessa noite viu em sonhos um esplêndido palácio, com salas cheias de armas,  nas quais estava gravado o sinal da cruz, e ouviu uma voz que lhe dizia que tais armas lhe pertenciam e a seus soldados. Ele não compreendeu o significado desse sonho, que não lhe saiu mais da cabeça. Alistou-se no exército de Galterio e Briena no sul da Itália e partiu para a guerra com o ideal de triunfar.

Após a partida, na primeira noite em que o exército de se reuniu próximo à cidade de Espoleto, Francisco, novamente com febre e doente, ouviu Deus perguntar-lhe: “Francisco, a quem deves servir, ao Senhor ou ao servo?”. Francisco responde: “Ao Senhor”. “Então, por que trocas o Senhor pelo Servo?”, responde Deus. Francisco compreendeu que deveria servir a Deus, abandonou o seu ideal de cavaleiro e retornou a Assis, sendo humilhado e recebendo zombarias.

Aos poucos foi se transformando. Buscava lugares isolados no campo e ali passava horas sozinho. Quando encontrava um mendigo, doava o que dispunha no momento. Durante sua conversão, foi se habituando à oração, pois sofria com as dúvidas e as fraquezas humanas. Num momento difícil da sua vida, deparou-se com um leproso e, diante do horror das feridas em seu corpo e do odor que exalava, pensou em fugir. Movido, então, por um grande amor, venceu o preconceito, voltou-se para o leproso, abraçou-o e beijou-o, reconhecendo nele um irmão.

Em outra ocasião também importante, achava-se em oração na Igreja de São Damião – uma capelinha quase destruída – e, ajoelhado em oração aos pés de um cruxifixo bizantino venerado pela piedade popular venerava, passou a observar as paredes caídas ao redor, quando uma voz, saída do crucifixo, lhe falou: “Francisco, vai e reconstrói a minha Igreja que está em ruínas”. Não percebendo o alcance desse chamado e vendo que aquela Igrejinha estava precisando de urgente reforma, Francisco regressou a Assis, tomou da loja paterna um grande fardo de fina fazenda e vendeu-a. Retornando, colocou o dinheiro nas mãos do sacerdote de São Damião, oferecendo-se para ajudá-lo na reconstrução da capela com suas próprias mãos.

 

Encolerizado, Francisco precisou se esconder da fúria paterna, pois Pedro Bernardone viu que havia perdido seu dinheiro e que sua casa comercial estava sendo desfalcada por Francisco, que levava gratuitamente mercadorias e alimentos para os necessitados.

Certo dia saiu resolutamente a mendigar o sustento de porta em porta na cidade de Assis. Para Bernardone isso já era demais. Como podia ele envergonhar de tal forma sua família? Se seu filho havia perdido o juízo, era necessário encarcerá-lo! Assim, Francisco experimentou mais uma vez o cativeiro, desta feita num escuro cubículo debaixo da escada da própria casa paterna. Pelo que sabemos, depois de alguns dias, movida pela compaixão, sua mãe abriu-lhe às escondidas a porta e o deixou partir livremente para seguir o seu destino.

Então compreendeu o pedido de Deus para reconstruir a igreja d’Ele. Para empreender o projeto, Francisco retirou recursos do pai. Este, já enfurecido pelas atitudes de Francisco e prevendo o risco de perder o patrimônio nas mãos do filho maluco, abriu um processo perante o Bispo para deserdá-lo. Diante das acusações do pai, na frente do Bispo e de todos, Francisco tirou as próprias vestes e, nu, devolveu-as ao pai, dizendo: “Daqui em diante tenho somente um pai, o Pai Nosso do Céu!”

Francisco passou a reconstruir as igrejinhas caídas com o seu próprio trabalho, assentando pedras, comendo do que lhe davam na mendicância da rua e adotando como vestes trapos de eremita.

Depois que reconstruiu a Igreja de São Damião, restaurou uma capela próxima aos muros de Assis e também a Igreja de Santa Maria dos Anjos, conhecida como Porciúncula (que significa pequena porção de terra), na qual São Francisco decidiu permanecer. Armou ao lado dela uma choupana para dormir. Com o tempo, compreendeu que deveria reconstruir a Igreja dos fieis e não somente as Igrejas de pedra. Durante uma missa, ouvindo a leitura do Evangelho, compreendeu que os discípulos de Jesus não deviam possuir nem ouro, nem prata, nem duas túnicas, nem sandálias e que deviam pregar a paz e a conversão. No dia seguinte, os habitantes de Assis viram-no chegar não mais com roupas de eremita, mas com uma túnica simples, uma corda amarrada à cintura e os pés descalços. A todos que encontrava no caminho dizia: “A paz esteja com vocês!”

São Francisco passou a falar da vida do Evangelho nos lugares públicos de Assis. Agia com tamanha fé que o povo que antes o zombava passou a ouvi-lo com respeito e admiração. E assim passou a ter irmãos de conversão. Aos poucos, suas palavras foram tocando os corações. O primeiro foi Bernardo, um nobre e rico amigo seu; depois, Pedro Cattani e ambos, agindo conforme diz o evangelho, doaram tudo o que tinham aos pobres.

 

Quando o grupo chegou a doze irmãos, São Francisco decidiu ir até Roma e pedir a aprovação do Papa Inocêncio III para viverem a forma mais pura do Evangelho, de acordo com o desejo e a escolha que fizeram. Maravilhado com o propósito de vida daquele grupo e, especialmente, com a figura de Francisco, a clareza de sua opção e a firmeza que demonstrava, o Papa reconheceu nele o homem que vira em sonho, segurando as colunas da Igreja de Latrão (a igreja-mãe de todas as Igrejas do mundo), que ameaçava ruir. Percebendo que era o próprio Deus quem inspirava Francisco a viver radicalmente o Evangelho, e que traria vida nova a toda a Igreja, naquele tempo tão distanciada dos ensinamentos de Cristo, deu a aprovação oficial da igreja a seu modo de viver. Autorizou Francisco e seus seguidores a pregar o Evangelho nas igrejas e fora delas e se despediu deles abençoando-os. Esse fato histórico ocorreu em 16 de Abril de 1210, marcando o nascimento oficial da Ordem Franciscana.

Muitos outros Irmãos foram se juntando ao grupo para viver conforme Francisco. Os frades fizeram suas habitações em choupanas ao redor da Igrejinha da Porciúncula. Dividiam as atividades entre oração, ajuda aos pobres, cuidados aos leprosos e pregações nas cidades e também se dedicavam às atividades missionárias, saindo em duplas a lugares distantes e pagãos, sempre muito alegres, pacíficos e amigos dos pobres.

São Francisco fundou a Ordem dos Frades Menores e, posteriormente, fundou a Ordem de Santa Clara, abrindo o ideal franciscano para o veio feminino. Uma jovem de família nobre de Assis, chamada Clara Offreduccio, mais tarde chamada de Santa Clara de Assis, já admiradora do jovem Francisco, passou a admirá-lo mais ainda quando se tornou um inflamado pregador da alegria e da paz, da pobreza e do amor de Deus, não só por palavras, mas também com o exemplo de sua própria vida.

Insatisfeita com os esplendores da riqueza de sua família e o casamento principesco para o qual seus pais a encaminhavam, sonhava com uma vida mais cheia de sentido, que lhe trouxesse verdadeira felicidade e realização. Em março de 1212 (Domingo de Ramos), saiu de casa, sorrateiramente, em plena noite e foi procurar Francisco na Igrejinha de Santa Maria dos Anjos, onde ele e seus companheiros já a aguardavam. Em frente ao altar, Francisco cortou-lhe os longos e dourados cabelos, cobrindo-lhe a cabeça com um véu, sinal de que a donzela Clara fizera a sua consagração como Esposa de Cristo. Dias depois, sua irmã, Inês, veio lhe fazer companhia e alguns anos após, sua mãe e sua outra irmã seguiram os propósitos de Clara, indo morar no conventinho de São Damião, a primeira moradia das Clarissas.  Com o correr dos anos, rainhas e princesas, e também humildes camponesas, ingressaram naquele convento para viver, à luz do Evangelho, a aventura das Damas Pobres, seguidoras de São Francisco, em que muitas se tornaram grandes exemplos de santidade para toda a igreja.

Muitos Cristãos, ouvindo São Francisco, decidiram seguir o seu exemplo e ensinamento. São Francisco assistiu ao crescimento da Ordem, que se espalhou por diversas partes do mundo.  Por volta de 1220, Francisco deu início à Ordem Terceira Secular para homens e mulheres, casados ou não, que continuavam em suas atividades na sociedade, vivendo o Evangelho.

Em 1221, São Francisco escreve uma nova regra para a Ordem Franciscana, que foi aprovada em 29 de novembro de 1223 pelo papa Honório e que vigora até os dias de hoje.

Embora a velhice não tivesse chegado, seu frágil corpo debilitou-se, agravado por um problema nas vistas que o deixou quase cego. Em certos períodos, isolava-se para orações e jejum. No Monte Alverne, nos Apeninos, envolvido em fluidos superiores, Francisco refazia suas forças de vez em quando. Certa vez, ali ficou por quinze dias sem comer e sem beber. Alguns diziam que o Arcanjo Miguel aparecia a Francisco com frequência. Frei Filipe o visitou e viu que dele saía uma luz dourada; ajoelhou-se e, chorando, orou. Alguns fiéis que chegaram fizeram o mesmo e Francisco falou as palavras que devemos repetir a cada cumprimento: “Que a paz de Deus esteja convosco.”

Em uma noite memorável, quando pediu humildemente a Jesus, mesmo não merecendo tanta glória, que se fosse da vontade Divina as chagas imortalizadas pelo Mestre tomassem conta de seu maltratado corpo. Acordou, então, com chagas nos pés e nas mãos. Numa dessas ocasiões, também no Monte Alverne, Francisco, que tanto buscou se assemelhar a Jesus, teve igualmente as feridas da crucifixação. Com muita dor, mas intensa alegria, por ter as marcas de Jesus no próprio corpo, recebeu as feridas que se mantiveram vivas até o fim de sua vida, que ocorreu dois anos depois.  Quando desceu o monte, apesar de sempre andar a pé, permitiu-se montar num burrinho, tal era a sua debilidade. Ao se aproximar da cidade, uma multidão já o aguardava. O povo, principalmente pobres e doentes, desejava ir ao encontro de São Francisco.

Pouco antes de morrer, de passagem por São Damião para despedir-se de Clara e suas irmãs, seu estado se agravou e teve de passar a noite numa choupana, sob as condições de intenso frio. Pela manhã, São Francisco cantava um cântico que compôs em louvor a Deus, chamando de irmãos o Sol, as estrelas, a Lua, a Terra, o vento e todas as criaturas.

Numa choupana junto à Porciúncula, no anoitecer do dia 3 de outubro de 1226, São Francisco pede aos irmãos que o dispam e o coloquem, nu, sobre a terra do chão. Ouvindo o Evangelho de João, onde se narra a Páscoa do Senhor, e recitando o Salmo 142, que os irmãos acompanhavam lentamente, São Francisco morreu cantando. Foi sepultado em 4 de outubro de 1226, domingo, na Igreja de São Jorge, na cidade de Assis.

São Francisco de Assis foi canonizado em 1228 por Gregório IX e seu dia é comemorado em 4 de outubro. Em 25 de maio de 1230 os ossos de São Francisco foram levados da Igreja de São Jorge para a nova Basílica construída para ele, a Basílica de São Francisco, hoje aos cuidados dos Frades Menores Conventuais.